Papo de pai #3: Paternidade conquistada com sucesso

26 ago

por Jairo Lopes*

 Minha relação com Dimitri começou de  forma complicada, creio que muitas assim começam…

Dimi - Jairo - e Rukia

Dimi – Jairo – e Rukia

Foi algo realmente inesperado, a vida tinha seguido um curso em que paternidade não parecia algo imaginável. Mas ela aconteceu. Eu e minha esposa estávamos separados, e ela engravidou, então voltamos, e desde o início eu sabia que não era pai biológico do meu filho.

Durante a gravidez me comportei como um estereótipo de pai, tentei mas não tinha o apego que a mãe esperava que eu tivesse. Dentro de mim, sabia que a minha relação realmente começaria com a chegada dele e fazia o que podia para tornar essa chegada a melhor possível. Não era falta de sensibilidade (pelo menos gosto de acreditar que não) e, sim, algo que me dizia que a única pessoa que poderia me aprovar como pai era o Dimi, não importa o que a mãe dele queria que eu fosse ou o que eu gostaria de ser e, sim, se ele me aceitaria.

Durante a gestação, manifestei algumas opiniões, inclusive sobre o nome, mas sabia que não cabia a mim decidir, essas decisões diziam respeito a mãe e ao pai biológicos dele. Situações assim me faziam ter mais certeza de que a minha situação paternal dependeria exclusivamente da minha relação com o Dimi, e isso me assustava bastante, afinal, eu nunca fui o mais querido em festas infantis…

Então, ele chegou, e, pra surpresa de muitos (inclusive a minha) lidar com o Dimitri foi natural. Ele era pequeno, eu conseguia segurar sua cabeça com uma mão e seu corpo cabia folgado no meu antebraço. Quando voltamos para casa não conseguia fazer muita coisa, existia uma ansiedade por estar com ele e óbvio que existia medo, mas aprendemos a lidar com isso e a vencer o medo.

Dimitri foi crescendo e me aceitando.

Não me via como outra coisas senão um pai e, finalmente, percebi que encontrei a realização que busquei a vida inteira.

O medo de ser pai vinha de longa data, creio que daquela velha história de que, no fim, somos parecidos com nossos pais, e, por mais que ame o meu, não gostaria de oferecer a uma outra pessoa o que me foi oferecido. Junte isso a uma descrença pela humanidade como um todo e você se pergunta…

Por que diabos vou querer ter um filho?

Mas ter filhos não tem nada a ver com lógica e encontrar uma resposta.

Tem um bocado a ver com herança e estar vivo.

Sobre a tal herança...

Sobre a tal herança…

Lembro de um tempo antes da gravidez, conversando com um amigo-pai (depois da paternidade você não é mais apenas um alguém, você passa a ser identificado como propriedade dos seus filhos) que me disse que a maravilha de ser pai tinha a ver com a herança que se deixava, não a herança genética ou econômica, mas com os trejeitos, manias e traços que marcamos nos nossos filhos.

Em saber que ele aprendeu a ‘tocar guitarra com a piroca’, a banguear ouvindo Alice in Chains e a não gostar tanto assim de futebol.

Essas heranças, na verdade, acabam sendo passadas pela vida toda. Às vezes percebo como recebi minha herança paterna quando reparo que meu filho está herdando parte da dele. Isso acaba nos fazendo mais vivos, ganhamos a imortalidade nessa herança.

Se me perguntarem o que é ser pai, creio que é uma luta constante.

Já saímos perdendo. A mãe tem o vínculo da gestação, dos meses sentido a vida se gerar, e nós temos apenas aquela mão na barriga pra tentar sentir algo. O que até aquelas pessoas que a mãe não vê há anos se tem na liberdade de fazer.

Então o filho vem e nos primeiros meses ele só reconhece a mãe, somos apenas a pessoa que carrega, nana, troca fralda e faz outros serviços gerais. Leva um tempo para sermos vistos como alguém e, por algum motivo, lutamos por espaço.

Existe aquela celebre frase “o homem provê” e creio que nos resta isso. Creio que prover, nesse caso, seja uma forma de proteger, de ofertar algo, de começar a passar a herança aos nossos filhos.

E então ele sorri, e seu sorriso, abraço e as primeiras palavras dirigidas a nós são a recompensa de nossa luta.

Antigamente, e em algumas comunidades mais primitivas atuais, o homem ainda é o combatente, o guardião, aquele que caça, ou seja, que provê e passa a sua herança ao seus filhos através do ofício.

Hoje em dia esperamos que nossos filhos sejam ainda mais do que fomos, alguns ainda querem passar sua herança através do seu ofício, outros, como eu, só desejam oferecer a possibilidade de escolhas, de poder prover uma estrutura social-psicológica-econômica-cultural digna o suficiente para que ele possa escolher o caminho que vai trilhar.Não é uma escolha fácil e cabe a nós prepará-los para isso.

Um filho é uma contradição, nos rejuvenesce e envelhece ao mesmo tempo.

Sua alegria contagia, seu ritmo nos recarrega e a vontade de ofertar a ele escolhas nos faz ter a persistência de seguir lutando. Da mesma forma que a velocidade com que ele cresce é um cronômetro da nossa velhice, ele nos diz que 2 anos se passaram muito rápido, que a casa dos trinta está voando e que todo momento é importante, também mostra que nesses dois anos muita coisa ocorreu e que foram muito bem aproveitados. Nos faz ver que em um mês as coisas mudam drasticamente, passos começam a ser ensaiados, palavras começam a brotar, escolhas e preferências começam a ficar mais evidentes.

Quando nos damos conta, até o controle remoto nos foi levado…

Assim como alguns outros controles que um dia acreditávamos ter.

Jairo e Dimi

Jairo e Dimi

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*Jairo Lopes é desenhista, artista gráfico, diagramador, arte finalista, marido de Ju Blasina – uma das autoras desse blog – e pai do Dimi.

Conheça um pouco do trabalho dele, aqui → lopesjairo.wix.com/jairo_tx

Uma resposta to “Papo de pai #3: Paternidade conquistada com sucesso”

  1. Geraldo Roberto da Silva 28 de agosto de 2014 às 10:35 AM #

    Belo depoimento, Jairo!

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